A freguesia de Santa Maria dos Olivais e zona oriental de lisboa: breve caracterização histórica
Numa freguesia caracterizada pela profusão de quintas, começam a surgir, nos finais do séc. XVIII e primeira metade do séc. XIX, as primeiras fábricas ou indústrias nos Olivais – curtumes, pregos, chitas – e, na zona da doca dos Olivais assiste-se ao desenvolvimento de actividades marítimas como a pesca, a extracção do sal e os serviços de pilotagem do rio Tejo. Em consequência disso e no contexto sócio - político da revolução liberal de 1832-34, a aristocracia proprietária das quintas vai dando lugar a uma burguesia recém-enriquecida de comerciantes, industriais e outros homens de negócios (de vinhos).[i]
A partir de 1851, e da elevação dos Olivais à categoria administrativa de Concelho surgem mais unidades fabris, o que não altera o aspecto bucólico da paisagem do concelho (a maioria das quais estava localizada em Xabregas e no Poço do Bispo); em 1856 é inaugurado o caminho de ferro (Poço de Bispo/Olivais e Braço de Prata/ Cabo Ruivo) e em 1886 o concelho dos Olivais é extinto, apesar do aumento populacional verificado durante este período (de 1840 com 2000 habitantes e 629 fogos, passa, em 1900, a 7164 e 1486). Para além da função industrial, esta zona constituía um local de atracção para o lazer e passeio dos lisboetas, dada a localização privilegiada junto ao Rio.[ii]
No séc. XX e com a vigência do Estado Novo, a freguesia dos Olivais, incluindo a zona que corresponde à área de intervenção da Expo98, virá a sofrer profundas alterações urbanísticas e funcionais. Em 1938 é estabelecida em Cabo Ruivo uma base naval para hidroaviões. Dois anos mais tarde, em 1940, é instalada a refinaria de Petróleo - que se manteria até à fase de intervenção ligada ao projecto Expo`98, com sucessivas ampliações em 1955 e 1970. A inauguração do Aeroporto da Portela em 1942 é outro momento importante para a freguesia que assiste, ao longo da vigência do Estado Novo, ao crescimento da sua população que a tornará na mais populosa, embora mais extensa freguesia de Lisboa.[iii]
A importância dos Olivais e da Zona Oriental como zona industrial desde o séc. XIX resulta segundo Teresa Barata Salgueiro (1999: 139) da sua localização privilegiada: “As zonas oriental e ocidental na coroa da cidade prolongam as margens do centro tradicional e têm também tradição industrial, pelo menos desde o século passado. Começaram por beneficiar da localização junto do rio, por onde recebiam a lenha, o carvão e os produtos a transformar, localização cujas vantagens, em termos de acessibilidade, foram reforçadas pela instalação da linha férrea, do centro de Lisboa para Norte e, mais tarde, no que toca ao sector Oriental pela construção da auto-estrada do Norte”.
Nas décadas de 70 e 80 a área urbana com 5 km de frente ribeirinha e uma área de 330 hectares começa a revelar sinais de degradação e abandono que englobavam uma refinaria, um complexo de armazenagem de produtos petrolíferos, um depósito de material de guerra, um matadouro industrial, um aterro sanitário, um parque de contentores e que tinha cerca de 3.000.000 de toneladas de lixos de Lisboa depositados em condições deficientes. [iv]
A zona de intervenção [v]
A chamada Zona de Intervenção, situada na Zona Oriental de Lisboa, junto da Doca dos Olivais estava desvalorizada e degradada, com níveis de poluição elevados, nenhuma capacidade de atracção, sem equipamentos, sem acessos e transportes, com funções de reduzida importância, e finalmente com uma má imagem urbana (apesar de estar inserida numa área que possuía qualidades indiscutíveis ao nível paisagístico, o que constitui uma mais-valia importante para a recuperação e atracção de investimento). Para Matias Ferreira, a zona oriental da cidade era associada, “a uma área com indústrias poluentes, (nomeadamente petrolíferas e químicas), com instalações obsoletas e desactivadas e por outro a uma área desqualificada e degradada, do ponto de vista habitacional e urbanístico, com predominância de bairros operários, instalados aquando do processo de industrialização da região de Lisboa. A zona oriental de Lisboa apresentava áreas de habitação social recente muito degradada, com extensos bairros de barracas, e ao nível socio-económico das populações residentes uma estrutura social com predominância dos estratos mais baixos, sob os pontos de vista económico e cultural. Era ainda associada à ideia de zona onde é difícil chegar, com acessibilidades muito deficientes.” [vi]
No início da década de noventa, as instâncias Centrais (Governo) e locais (Câmara Municipal de Lisboa) assumem a necessidade de assegurar a intervenção para:
“Obter um maior equilíbrio interno da cidade e área metropolitana, na distribuição das principais funções; Estancar o decréscimo e envelhecimento populacional de Lisboa cidade, fixando jovens e atraindo novos residentes e revalorizando a função habitacional; Potencializar a Re-qualificação das actividades económicas, culturais e científicas, através da sua melhor inserção urbana; Recuperar a frente ribeirinha, abrindo a cidade ao rio, requalificando os espaços públicos e reequilibrando as áreas verdes em toda a cidade, com vista a uma maior qualidade urbanística e ambiental; Melhorar as infra-estruturas de suporte, nomeadamente suprir as carências de transportes e comunicações, sob pena de se agravarem as rupturas do sistema.“ [vii]
Zona oriental de lisboa: o papel da Câmara Municipal de Lisboa – o “Plano Estratégico de Lisboa”
No âmbito do chamado “Plano Estratégico de Lisboa” [viii] a Câmara Municipal de Lisboa presidida por Jorge Sampaio elaborou um plano de médio e longo prazo para a Cidade de Lisboa, aproveitando a dupla oportunidade proporcionada pela realização da “Lisboa Capital Europeia da Cultura” e da “Exposição Mundial de Lisboa” considerados “acontecimentos de importância fundamental para o futuro de Lisboa” [ix].
A afirmação da cidade de Lisboa num contexto político, económico e social decorrente da adesão á Comunidade Económica Europeia a 1 de Janeiro de 1986 e consequente integração de Portugal é apresentada da seguinte forma, no documento: “a integração de Portugal na C.E.E e a realização a partir de 1993 do grande mercado interno europeu num período histórico em que se mundializam as acitivdades económicas, científicas, culturais e políticas colocam Lisboa perante a necessidade de encontrar o seu lugar próprio na rede de cidades europeias e de, nesta, assumir, estratégias competitivas assentes em factores de progresso”.[x] Para, além disso, o fenómeno da internacionalização da economia mundial “acelera as mutações nas formas de mobilização dos recursos humanos, científicos e tecnológicos e das formas de organização do espaço, reforçando cada vez mais o papel da informação. A internacionalização condiciona o papel das realidades nacionais afirmando o peso das realidades e instâncias supranacionais (de que a C.E.E é o exemplo mais dinâmico) e o das realidades infranacionais (grandes regiões e metrópoles). Como os espaços económico-sociais onde se definem estratégias com autonomia face ás prosseguidas no tradicional quadro nacional”[xi].
“E nesse sentido, destaca-se a necessidade de apoiar os sectores mais competitivos, isto é, com recursos humanos mais qualificados e tecnologicamente mais bem apetrechados, privilegiando os bens e serviços de maior valor acrescentado – na óptica da exportação, o turismo joga um papel vital – numa lógica espacial que não pode ser confinada ao território de Lisboa, mas sim, e cada vez mais, ao da Região Metropolitana” [xii] .
Enfim, o princípio estruturador do plano estratégico é “Lisboa Capital Atlântica da Europa” dada a influência determinante da localização geográfica da cidade na sua história, na sua configuração e no seu papel num contexto nacional, regional e mundial, “Lisboa, afirmou-se numa tripla dimensão : como cidade capital, como cidade europeia e como cidade atlântica. A Vocação de Lisboa tem que se encontrar no cruzamento destas dimensões.” [xiii]
No âmbito deste plano, a zona Oriental de Lisboa e a sua qualificação constitui um compromisso inscrito neste plano de médio e longo prazo: “A Zona oriental de Lisboa abrange cerca de 1.800ha cerca de 22% da área do concelho e nela residem cerca de 126 mil pessoas. É uma área tradicionalmente desvalorizada, votada à mono – funcionalidade dos projectos urbanísticos, às deficientes condições de acessibilidade, à degradação dos valores patrimoniais, naturais e histórica e separada do rio pelas implantações industriais e de uso portuário.” A recente decisão da escolha da zona oriental para a realização da Expo assim como a perspectiva da concretização, nesta área de uma nova travessia do Tejo, podem constituir factores decisivos de uma acelerada transformação desta parte da cidade ".
QUALIFICAÇÃO DA ZONA ORIENTAL
1. DESCRIÇÃO
|
2. JUSTIFICAÇÃO /RELAÇÃO COM OS OBJECTIVOS DO PLANO
|
Programa de Qualificação da zona oriental de Lisboa eliminando as barreiras que a separam da cidade nomeadamente através de :
- Ordenamento urbanístico, aproveitando os seus valores naturais e construídos, a sua centralidade e as suas áreas intersticiais.
- Programa de investimentos aproveitando as sinergias da Expo`98 : centro cívico dos Olivais, Prolongamento da Av. dos EUA; Avenida central de Chelas; Avenida Infante D. Henrique; Extensão do Metro....
- Implantação de novas actividades industriais, de investigação e de terciário avançado.
|
Recuperação de uma zona tradicionalmente desvalorizada e desqualificada, que reúne condições potenciais de grande valor, se devidamente aproveitadas com disponibilidade de terrenos municipais e privados para a valorização, modernização e qualificação da cidade;
|
3 INCONVENIENTES DA NÃO REALIZAÇÃO
|
4. RESPONSÁVEIS
|
Manutenção da situação de desvalorização e desqualificação
|
Câmara Municipal de Lisboa
Operadores públicos e privados
Comissariado para a Expo 98
|
[i] “Pelas Freguesias de Lisboa – Lisboa Oriental” de Consiglieri, Carlos; Ribeiro, Filomena et altri página 139/140, Câmara Municipal de Lisboa, 1993
[iv] Dados retirados do “Relatório Final da Exposição Mundial de Lisboa” Parque Expo 98, 1998
[v]Designação atribuída pelos responsáveis da Expo ‘98 à zona escolhida para a realização da Exposição Mundial de 1998;
[vi] “ A Cidade DA EXPO’98” de Vitor Matias Ferreira E Francesco Indovina (org.), página 212, 1999, Editorial Bizâncio
[vii] “Manual do Formando da Expo’98, Módulo I, pág.34, 1997
[viii] “Plano Estratégico de Lisboa”, C.M.L, Outubro 1992;